30 de janeiro de 2011

A construção civil predadora e a sustentável

Arquivo: Agência Estado

 O Centro de Pesquisas da Petrobrás (RJ), exemplo de construção sustentável

O padrão dominante da construção civil no Brasil é predador, ou seja, o que destrói violentamente o meio ambiente natural. E aqui, não estamos poupando nenhum tipo de construção: condomínios residenciais, complexos industriais ou comerciais, complexos desportivos, bairros “planejados”, prédios de instituições públicas e até na urbanização de muitas praças e outros logradouros.
Como na maioria das grandes e médias cidades brasileiras, em Aracaju prevalece esta mentalidade, que provoca agressões violentas ao ambiente e a qualidade de vida das pessoas.
Construções que são verdadeiros tablados de concreto e de asfalto, em antigas áreas verdes, num profundo desrespeito ao ambiente natural. Obras tocadas pela lógica do menor custo e do maior lucro possível.
Tal “estilo” de construir provoca insolação inclemente, alterando o micro clima dos bairros e da cidade como um todo, como se não bastasse o aquecimento global.
A impermeabilização do solo impede a absorção da água da chuva pelos lençóis freáticos, aumentando o volume dos resíduos líquidos na rede de esgotos e o depósito dos mesmos nos canais e rios, fatores que potencializam a ocorrência de enchentes. Situação agravante em uma cidade como Aracaju, com pouca altitude em relação ao nível do mar e cercada por rios (Sergipe, do Sal, Poxim, Pitanga e Vaza Barris) cujos regimes dependem das marés.
            Seria cômico, se não fosse trágico, como várias construtoras enfatizam a “responsabilidade socioambiental” na propaganda de seus empreendimentos, quando no geral, as características reais são completamente opostas ao que se compreende como construções sustentáveis. É a visão retrógrada do construir, na contramão dos novos paradigmas mundiais de respeito ao ser humano e à natureza.
A Câmara Especializada de Engenharia Civil do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia – CONFEA e o Sistema CONFEA/CREA, em seus congressos oficiais da Engenharia, da Arquitetura e da Agronomia, vêm deliberando sobre a análise de projetos de obras que verifique se estão dentro das normas de sustentabilidade ambiental.
Apelos e sugestões não faltam de ecólogos, ambientalistas, engenheiros e urbanistas avançados, empresas de reciclagem, ONGs, universidades e outras instituições de pesquisa. Além de inúmeras reportagens e artigos nos meios de comunicação social e manuais de métodos e técnicas em livros, revistas especializadas e em sites e blogs na internet. O que falta é lei regulamentar ou o seu cumprimento.
O princípio da sustentabilidade na construção civil tem como objetivos diminuir impactos sócio-ambientais, cortar os desperdícios, proporcionar vantagens econômicas a curto e médio prazo e melhorar a qualidade de vida de usuários e dos habitantes da cidade. Sobre o assunto ver o site do Conselho Brasileiro de Construção Sustentável [ WWW.cbcs.org.br ]  e da ONG Construindo um Brasil Sustentável [ WWW.gbcbrasil.org.br ].
A seguir, sintetizamos algumas das experiências ambientalmente corretas mais usadas na construção civil com verdadeira responsabilidade sócio-ambiental.
O “paisagismo nativo” visa manter a biodiversidade existente do local a ser realizada a construção. Ao planejar a construção, deve ser mantida parte da vegetação e águas pré-existentes na área do canteiro de obras, como bosques, árvores centenárias, riachos ou lagos. Rompendo com a urbanização desconfortável, sufocante e estressante. Áreas verdes contribuem para a beleza paisagística, renovação do ar,  diminuição do barulho, de ventanias e da insolação, tornando o ambiente mais saudável e aprazível.
A vanguarda do atraso faz o oposto, desmata a vegetação a golpes de trator de lagarta e aterra corpos de água com milhares de toneladas de areia para dar lugar a gigantes de concreto e de vidro fumê.
Uso de cimento CP3 ou CP4 com menor impacto ambiental que o tradicional Portland.
            Reciclagem de resíduos da construção (entulhos como brita e areia), que pode ter aproveitamento de no mínimo 50% do volume para reciclagem ou reuso dos mesmos na feitura do contra piso.
Pintura externa e interna com tinta à base de terra, minerais e água. São 100% naturais e minimizam a emissão de compostos voláteis que agridem o meio ambiente, as pessoas, animais e a camada de ozônio.
            Projetos que contemplam janelas grandes com vidro transparente, e fachadas com vidro de alto desempenho, proporcionando grande quantidade de luz natural dentro do ambiente, ao tempo que controla a radiação solar. Iniciativas que maximizam o potencial de vistas externas do edifício, oferecendo conforto visual e psicológico aos moradores, funcionários e visitantes, além de promover grande economia de energia elétrica.
Formas arquitetônicas que favoreçam a ventilação natural através de estratégias de ventilação cruzada, efeito chaminé e orientação para os ventos predominantes do local da construção. Essas opções reduzem o uso de ar condicionado e de iluminação elétrica pelo dia, provocando uma economia de 23% de energia, além de favorecer a areação da cidade.
A construção civil paleolítica, com a conivência de setores do “poder público” de interesse privado, cria enormes barreiras de concreto na orla das cidades litorâneas, inviabilizando a ventilação e tornando o calor próximo do insuportável. Quer testar? Passei nos calçadões do Centro de Aracaju ou em ruas da zona sul numa manhã de verão. Você volta para casa com a sensação de que foi assado em um forno microondas.
Outra opção para economizar, ainda mais energia elétrica, é o uso da energia solar, inesgotável e praticamente permanente no Nordeste brasileiro. É obtida através da instalação de placas de silício com células fotovoltaicas para o aquecimento da água, evitando o uso dos dispendiosos chuveiros elétricos.
O telhado verde, ou seja, telhado com placas de vegetação, de gramíneas, purifica o ar, é isolante térmico, minimiza a necessidade de climatização artificial (ventilador e ar condicionado), economiza energia e dar graça e beleza à construção, além de reduzir em 90% o fluxo de calor nos ambientes internos, de ser isolante acústico, reduzindo os ruídos do local. [ Ver:  WWW.ecotelhado.com.br ].
O telhado reciclado consiste no uso de telhas produzidas com embalagens usadas de leite longa vida recicladas. São mais resistentes, leves e duradouras de que as telhas convencionais de cerâmica. Essas últimas degradam o meio ambiente através da retirada sistemática do solo, da poluição atmosférica e da devastação de matas para transformar em lenha na sua fabricação em olarias. [ Ver: WWW.recicoleta.com.br ]
            O telhado branco mantém o ambiente interno mais fresco durante o dia e reduz o consumo de energia elétrica. Coberturas brancas refletem 90% do calor, enquanto as mais escuras ou de cerâmica absorvem 80% do calor.
            Paredes verdes, ou seja, fachadas com vegetação natural utilizando plantas trepadeiras auxiliam na melhoria do ar e no sombreamento externo.
Calçadas pavimentadas com lajotas de cimento. Entre essas, valas com grama para não impermeabilizar o solo, permitindo o escoamento da água da chuva para o lençol freático.
Uso de sistemas de captação de água da chuva que cai do telhado. A água tratada e armazenada pode ser utilizada para fins “menos nobres” que não seja beber, cozinhar e banho. Para uso nos banheiros (descargas), na limpeza e na irrigação dos jardins e outras áreas verdes do próprio prédio ou do condomínio. Reduz o consumo de água, numa média de 35%. [ Ver o site da Associação Brasileira de Captação e Manejo de Água da Chuva: WWW.abcmac.org.br ].
Outra iniciativa para a economia de água é a utilização de mictórios que não utilizam o líquido precioso para a descarga ou utiliza a chamada “água cinza”, ou seja, resíduo líquido do banho, do lavatório e da lavagem de roupa captado do esgoto doméstico, excluindo o do vaso sanitário. A “água cinza” é reciclada em tanques de estocagem no subsolo, bombeada para outro reservatório no terraço e reutilizada na descarga sanitária. 
            Como dissemos, essas são apenas algumas das inúmeras soluções práticas para transformar o modo de construir, de trocar o paradigma atrasado e predador, pelo sustentável.
            A foto acima é do Centro de Pesquisas da Petrobrás, na Ilha do Fundão no Rio de Janeiro. Um dos grandes exemplos da arquitetura sustentável no Brasil. Possui espaços verdes entre as edificações e jardins internos, para motivar a integração entre as pessoas e a natureza; há um maior aproveitamento de áreas de sombra e ventilação; capta a luz solar e a ventilação natural; aproveita a água da chuva e dar tratamento físico-químico aos esgotos, reutilizando a água em 60% que é usada na irrigação e nos sanitários [www2.petrobras.com.br/tecnologia].
Em Aracaju, já começa a existir construções com características sustentáveis: a nova sede do Ministério Público Estadual (em construção no bairro Capucho, entre a Secretaria da Fazenda e o Fórum Gumersindo Bessa) e hotéis com painéis de captação de energia solar.
            Para que a construção sustentável se torne a nova cultura no fazer edificações, será necessário um longo caminho a percorrer em nossa província. Até lá, quanto desperdício? Quanta destruição? O quanto será a queda da qualidade de vida de nossas cidades?
A sensibilidade e a determinação dos empresários e técnicos do setor, dos governantes, parlamentares e procuradores públicos, dos órgãos gestores e/ou fiscalizadores da urbanização e dos consumidores do mercado imobiliário, serão de fundamental importância para que o caminho seja encurtado.

(*) Artigo do 1º Secretário Antônio Wanderley publicada no Jornal do Dia – Aracaju/SE/Brasil – em 29 jan 2011.

20 de janeiro de 2011

Depósitos de cascalho, aterros e incêndios criminosos no Bairro Jabotiana

Incêndio provocado rente ao manguezal próximo ao loteamento Parque das Mangueiras

No Bairro Jabotiana, na zona oeste de Aracaju, e nas adjacências além da fronteira com São Cristóvão, vêm ocorrendo, de maneira generalizada, inúmeros aterros a áreas de vegetação permanente, sobretudo nos manguezais do rio Poxim, dos seus afluentes e das lagoas daquela área.
            Como o bairro é habitado, em sua maioria, por pessoas da classe média, os moradores constroem e reformam imóveis com bastante intensidade. Além disso, a localidade vem sofrendo uma expansão descontrolada da construção civil. Neste momento, muitos condomínios estão sendo construídos. Assim, a produção de resíduos sólidos da construção civil (cascalho) é enorme.
            Para se verem livres do cascalho, os moradores apelam para o serviço de carroceiros. Muitos desses, por falta de escrúpulos ou de consciência, depositam a “carga” nas áreas de manguezais e de outras formas de vegetação. Não obstante, existir um eco posto da PMA para a receptação do cascalho, localizado na margem direita do Canal Grageru, próximo à “Ponte do DETRAN”, em uma das entradas dos conjuntos Sol Nascente e JK. Mesmo assim, muitos carroceiros, por comodismo, não vão até lá. Despejam o cascalho em “qualquer lugar” ou nos “terrenos baldios”, ou seja, em locais onde existem as vegetações citadas.
            Algumas construtoras que atuam no bairro fazem o mesmo. Como sempre, nos feriados e feriadões, quando os órgãos de defesa do meio ambiente e a comunidade estão desmobilizados. E nesse caso, o montante de cascalho produzido é muito maior e seu expurgo ilegal é feito por caçambas.
Os montes de cascalhos estão por toda a parte, sufocando e matando a vegetação: em vários pontos das margens do rio Poxim, principalmente na rua Estrada da Cabrita entre o Largo da Aparecida e a rua Jabotianinha; no fundo do Campus III da Faculdade Pio Décimo e dos novos condomínios paralelos à avenida Tancredo Neves; nas margens do Canal Grageru, entre as escolas estaduais Joaquim Vieira Sobral e Manoel Franco Freire; no conjunto Santa Lúcia próximo à Lagoa Doce; na Mata Atlântica das margens da estrada de acesso ao povoado Aloque; no manguezal da “perna” (canal natural) do rio Poxim no loteamento Parque das Mangueiras. Este último denunciado por moradores do local em matéria do SE TV 2ª Edição da TV Sergipe em 25 de dezembro de 2010.
Em várias das ocorrências citadas acima, fica claro que existe um propósito deliberado de ordem econômica, uma vez extinta a vegetação: a especulação imobiliária.  
            Há manguezais “mortos” ou devastados subitamente, misteriosamente, sem nenhuma causa aparente. Como foi o caso do manguezal do noroeste do conjunto Santa Lúcia.
            Misteriosos também são os incêndios, sempre nas margens dos manguezais, e muitos deles nos próprios manguezais. Destacamos duas dessas ocorrências mais recentes, em dezembro de 2010: vegetação incendiada ao lado do condomínio Parque das Fontes (em construção) ao noroeste do conjunto Santa Lúcia, próximo ao manguezal “morto”; no dia 29 (uma quarta feira) pela manhã, flagramos um incêndio ao lado do campinho de futebol, há poucos metros do manguezal ao norte do loteamento Parque das Mangueiras.
            Também, no final de dezembro, ouvimos sons de motosserras pondo abaixo mangueiras centenárias em um sítio ao sul daquele mesmo loteamento. Moradores das proximidades nos informaram que saíram carretas carregadas de toras de madeira daquele local. Tudo isto para a construção de um crematório. Ironia singular.
            O que percebemos ao testemunhar e apresentar todos esses fatos, é que existe um forte sentimento de impunidade nos agentes dessas agressões. O Bairro Jabotiana, o “último bairro verde de Aracaju” e as adjacências, com suas belas paisagens naturais, são alvos de toda sorte de crimes ambientais. Quase todos denunciados por moradores sensíveis, movimentos ambientalistas locais e noticiados várias vezes por setores da mídia.
            Concluímos este escrito desalentador lembrando que o Código Florestal (Lei Federal 4.771/65 atualizada em 06.01.2001), em seu Artigo 2º, considera de preservação permanente, todas as formas de vegetação natural situadas ao longo dos rios, de qualquer curso d’água e ao redor de lagoas e reservatórios.
A Lei de Crimes Ambientais (Lei Federal 9.605/98) determina que destruir ou danificar florestas ou matas consideradas de preservação permanente implica em pena de detenção de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente (Art. 38º). Enquanto provocar incêndio em mata ou floresta, a pena é de dois a quatro anos de reclusão, e multa (Art. 41º).
Se o sentimento de impunidade permanecer nos agressores, por falta de punições, a devastação daquelas ocorrências vegetais será completa, fator que inviabilizara a existência dos rios, riachos e lagoas ali existentes. É urgente que sejam realizadas ações enérgicas e articuladas por parte da autoridade policial, dos órgãos ambientalistas ADEMA e IBAMA, e do Ministério Público do Meio Ambiente.

Aqui jaz um manguezal: ao noroeste do conjunto Santa Lúcia no Bairro Jabotiana 

*Artigo de Antônio Wanderley de Melo Corrêa publicado no Jornal do Dia (Aracaju – SE – Brasil) em 13 jan 2011. Pg. 04

12 de janeiro de 2011

O lixão, o aterro sanitário e a recilagem


          Lixão ou lixeira é a forma inadequada de depositar resíduos sólidos, em que o lixo é depositado diretamente no solo, sem qualquer técnica ou medida de controle, com sérios impactos ao meio ambiente e à saúde humana. Dentre os impactos causados, estão a proliferação de vetores de doenças (moscas, mosquitos, baratas, ratos etc.), a geração de odores desagradáveis e a contaminação do solo e das águas pelo chorume (o líquido da decomposição da matéria orgânica, o “caldo” do lixo). Os riscos de contaminação são agravados pelo desconhecimento da origem do material descartado, podendo haver resíduos perigosos.
            No proceder com o lixo, o correto é adotar medidas para tentar reduzir os impactos ao ambiente e à saúde. Muitas vezes, antigos lixões passam por algum tratamento técnico. A opção mais aceitável e segura é o aterro sanitário.
            Aterro sanitário é a forma de disposição final de resíduos sólidos que obedece a um conjunto de normas operacionais e critérios técnicos, de modo a evitar riscos à saúde pública e ao ambiente.
Os resíduos são depositados em terrenos impermeabilizados e a seguir compactados e cobertos por uma camada de terra. Este último procedimento evita o mau cheiro, o impacto visual e a proliferação de vetores de doenças.
A depender da profundidade do aterro, é possível depositar várias camadas de lixo sobrepostas, intercaladas por camadas de terra. Deve haver dispositivos para drenagem superficial da área, captação e tratamento do chorume, além da captação, armazenamento e tratamento dos gases produzidos pela decomposição do lixo, principalmente metano e dióxido de carbono.  
Um aterro sanitário deve contar com monitoramento ambiental e geotécnico permanente, além de um plano de encerramento de suas atividades.
O encerramento ocorre quando a última camada de resíduos sólidos é aterrada. Em seguida, tem início a recuperação da área com o depósito de nova camada de solo e replantio de árvores e outros vegetais. Assim, ao invés do antigo e insalubre lixão, a cidade ganha mais uma área verde e um espaço para o lazer.
            O aterro sanitário não elimina a coleta seletiva, o controle e a entrada de resíduos sólidos e a reciclagem. Se esses procedimentos não ocorrerem, o aterro sanitário tem sua vida útil reduzida, tornando necessária a construção de outros em pouco tempo. O que seria oneroso e ocuparia muito espaço.
            Quase todos os tipos de resíduo sólido podem ser reciclados, transformados em novos produtos e comercializados: o entulho das construções (plástico, vidro, madeira e pedra) se transforma em produtos, e o rejeito em aterros; os resíduos urbanos (lixo doméstico, comercial e industrial)
constituem-se em materiais aproveitáveis, depois de separados e preparados, são transformados em plástico, metais, vidro e papel; resíduos orgânicos são matéria prima para adubos; o lixo hospitalar, após tratamento físico-químico, são transformados em óxidos, metais e sais; o lixo industrial perigoso e os rejeitos dos outros tipos de resíduos sólidos podem sofrer tratamento térmico e serem geradores de calor, energia elétrica e combustível.
            Como foi visto, a reciclagem potencializa a economia, fornecendo matéria prima para diversas indústrias, além de gerar lucro, renda e empregos.  

Recortes das etapas de um aterro sanitário 


2 de janeiro de 2011

O verde e as águas do Bairro Jabotiana

O rio Poxim e o seu manguezal exuberante, separando os conjuntos JK e Santa Lúcia.

                O Bairro Jabotiana encontra-se na zona oeste de Aracaju, tendo o seguinte perímetro: a avenida Marechal Rondon, ao norte, dobrando para a avenida Tancredo Neves, ao leste, daí para o canal Grajeru (Aquele que é cruzado pela “Ponte do Detran”) que encontra o rio Poxim até este tocar a ferrovia e esta encontrar a linha imaginária divisória dos municípios de Aracaju e São Cristóvão, ao sul, seguindo a linha imaginária, ao oeste, até a mesma encontrar a avenida Marechal Rondon (Fonte: “Aracaju – Mapa Municipal Oficial”, SEPLAN-PMA/ENGEFOTO/PNAFM, 2004).
Aquela grande área, meio urbana e meio bucólica, é o último bairro verde de Aracaju, pelo menos por enquanto.
            O bairro citado é um espaço urbano reservado para moradias da classe média. Logo o avanço da urbanização é veloz e devorador sobre aquele verdadeiro santuário verde e aguado. Em menos de três anos foram e/ou estão sendo construídos quatro novos condomínios do PAR e oito privativos, quatro deles ao oeste do conjunto Santa Lúcia, outros quatro paralelos à avenida Tancredo Neves pelo oeste e dois entre o conjunto Sol Nascente e a comunidade Largo da Aparecida.
            Assim, o santuário verde e de águas abundantes padece em uma agonia não muito lenta e progressiva. Os conjuntos residenciais mais antigos: Sol Nascente, JK e Santa Lúcia, foram ocupando grandes áreas de matas, manguezais e barreiros; enquanto os condomínios de casas e de prédios vêm avançando sobre a vegetação, por assim dizer, da noite para o dia. Mas o que está feito é fato consumado.    
            Se o leitor que conhece pouco ou não conhece o Bairro Jabotiana fizer uma vistoria atenta ao mesmo, ficará espantado com a grande reserva de vegetação e de águas ainda existentes naquela zona de Aracaju, onde ocorrem resquícios de Mata Atlântica nas bordas da estrada do povoado Aloque e entorno daquela comunidade; manguezais abundantes nas margens dos rios Poxim Açu e Pitanga, e do canal Grajeru; duas grandes e lindas lagoas: Rio Doce (Ao sul do conjunto Santa Lúcia) e Areal (Ao norte da colina do Reservatório Apoiado da Deso, o R6), ambas com vegetação de entorno.
A mata do Aloque e a vegetação do entorno da lagoa Rio Doce vêm encolhendo devido a aterros e depósitos de cascalhos feitos por moradores desavisados ou mal intencionados; nas margens da lagoa Areal, a areia branca é extraída incessantemente; os rios são poluídos mortalmente pelos dejetos dos esgotos sanitários sem tratamento que afluem para os mesmos, bem como pelo hábito paleolítico de certos “cidadãos” de arremessarem, displicente, lixo sobre suas águas e margens; em alguns pontos, o manguezal do rio Poxim vem sendo destruído.
            Quando da construção de quatro condomínios ao oeste do conjunto Santa Lúcia, os mesmos foram erguidos em uma área anteriormente alagada, onde existiam lagoa e brejo, servindo naturalmente como sustentação do regime do rio Poxim, ou seja, como área de vazante de suas águas em momentos de maior volume, provocadas por alta pluviosidade ou por pico de maré. A área alagada foi aterrada velozmente, engolida pela areia das construtoras. O rio Poxim perdeu uma importante vazante. A conseqüência pode ser desastrosa, consistindo em maior probabilidade de suas águas invadirem áreas residenciais em alguns bairros de Aracaju, com mais freqüência, principalmente no Bairro Jabotiana, pelo fator topográfico, sendo os conjuntos JK e Santa Lúcia e a comunidade Jabotianinha as áreas mais fragilizadas.
Se as demais lagoas e brejos do baixo vale do rio Poxim passarem pelo processo acima exposto, coitadas das populações ribeirinhas. Aquele rio perderá suas últimas vazantes, toda a sua água se concentrará em seu próprio leito assoreado, o qual não comportará tamanho volume, transbordando para as ruas e infernizando a vida de centenas de famílias.
            A construção daquelas edificações foi licenciada pela Adema e pela Emurb. Pergunta-se: Houve um Relatório de Impacto Ambiental – RIMA.  Pelo menos é o que determina a lei. Se foi realizado, não preveu conseqüências tão lógicas?
As políticas públicas de urbanização não podem privilegiar somente os interesses do mercado imobiliário, em detrimento da sustentabilidade ambiental, da qualidade de vida e da segurança da população, tão declamadas em prosa e verso. Para tanto é fundamental que os poderes públicos municipal e estadual definam claramente o que deve ser preservado como patrimônio ambiental do povo de Aracaju.
Com boa vontade política e agilidade é possível evitar o pior, ou seja, que o último bairro verde e outras ocorrências naturais de Aracaju não se transformem em ambientes urbanos monótonos, densos e sufocantes, a sofrerem as conseqüências desastrosas provocadas pela insensibilidade, diante da destruição voraz das áreas naturais que ainda nos resta.
  
*Artigo publicado no Jornal do Dia em 05 dez. 2008. Pg. 04. De autoria de Antônio Wanderley de Melo Corrêa e revisado em dezembro de 2010.